PREPARO DO PACIENTE PARA O TRANSPLANTE DE FÍGADO
INTRODUÇÃO
O transplante de fígado é considerado uma das maiores cirurgias abdominais da atualidade. Apresenta riscos para o paciente, tanto em relação a morbidade quanto a mortalidade. Estes devem ser minimizados tanto quanto possível, por meio de uma avaliação minuciosa do candidato ao transplante, nos principais aspectos onde sabe-se ocorrer um maior índice de complicações peri-operatórias. É essencial a colaboração do paciente quanto aos procedimentos que serão realizados nas fases pré e pós operatórias. Para isso ele deve ser informado sobre todos os aspectos, e consentir com sua realização.
O preparo do paciente segue uma série de etapas, que incluem a comprovação da indicação, avaliação de possíveis contra-indicações, avaliações dos múltiplos aspectos envolvidos na problemática do transplante, e a orientação ao paciente sobre todos os procedimentos envolvidos desde a inclusão na lista de espera, até a fase pós-operatória. Vamos aprender um pouco sobre os aspectos da avaliação pré-transplante, orientações e preparo pré-operatório.
I – AVALIAÇÕES PRÉ-TRANSPLANTE
Avaliação cardíaca e risco cirúrgico
O bom funcionamento cardíaco tem papel fundamental no transplante hepático. Sabe-se que algumas doenças que levam a indicação de transplante, como a cirrose alcoólica, a hemocromatose e a polineuropatia amiloidótica familiar determinam efeitos diretos sobre a função cardíaca. Além disso, podem ocorrer cardiopatias independentes da doença hepática de base, como doença coronariana ou alterações cardíacas congênitas. Hepatites transfusionais com evolução para cirrose hepática podem ter sido adquiridas em cirurgias cardíacas prévias.
Oscilações de pressões sangüíneas, por hipovolemia real ou relativa, rápidas alterações iônicas, depressão miocárdica durante a revascularização hepática, em pacientes onde freqüentemente o padrão hemodinâmico é de hiperdinamia, são exemplos de aumento da demanda de função cardíaca durante o transplante hepático.
A avaliação da função cardíaca é realizada por meio de história clínica e exame físico detalhados, eletrocardiograma, radiografia simples de tórax e ecocardiograma. Nos casos suspeitos de alterações coronarianas, também é realizado cintilografia com dipiridamol. Se algum dos exames sugerir de forma mais evidente algum sinal de disfunção cardíaca, pode estar indicada a realização de estudo hemodinâmico invasivo, com medidas de pressões de câmaras direita e esquerda, medidas de débito cardíaco e coronariografia.
Avaliação pulmonar
A avaliação da função pulmonar é habitualmente realizada por meio de espirometria e gasometria arterial colhida em ar ambiente. Aspectos relacionados a doença hepática crônica podem interferir na função pulmonar, como nos casos de ascite volumosa, derrame pleural por comunicação entre as cavidades pleural e peritoneal na presença de ascite, e síndrome hepatopulmonar. Esta última corresponde a alteração da microvasculatura pulmonar, com abertura de comunicações arteriovenosas pulmonares, hipertensão pulmonar e hipoxemia, descrita em hepatopatas crônicos com hipertensão portal. O mecanismo intrínseco de seu aparecimento permanece incerto, mas esta já foi uma causa de contra-indicação para a realização de transplante hepático. Atualmente, admite-se que o transplante hepático, por regularizar o estado hemodinâmico do paciente, pode ser o principal método de tratamento desta síndrome, a não ser em casos extremamente avançados. Nestes casos, pode até ser indicada a realização de transplantes combinados de fígado e pulmão.
Avaliação renal
Sabe-se que a agressão renal por ocasião do transplante hepático é grande, tanto pela movimentação hemodinâmica intra-operatória quanto pela agressão renal por drogas, mormente imunossupressoras (como a ciclosporina e o FK-506). Algumas das doenças hepáticas que levam à indicação de transplante de fígado, como as cirroses por vírus B e C podem levar a crioglobulinemia e nefropatia membranosa ou membranoproliferativa. A função renal em casos de hepatopatia crônica terminal pode também estar prejudicada pela ocorrência da síndrome hepato-renal.
A avaliação da função renal para o transplante hepático baseia-se, além da história e exame clínico, de testes como urina tipo I (ou sumário de urina), proteinúria, níveis séricos de uréia e creatinina, ultra-sonografia renal e de vias urinárias, e em casos mais severos, biópsia renal.
A disfunção renal deve ser avaliada criteriosamente. Diferentemente do passado, quando disfunção renal grave era considerada contra-indicação de transplante hepático, os bons resultados obtidos com transplantes combinados fígado/rim, com mesmo doador cadáver, permitem a realização de transplantes em pacientes com comprometimento severo da função renal.
Avaliação psiquiátrica
A avaliação psiquiátrica é uma das poucas que pode contra-indicar claramente o transplante hepático. Tem por finalidade definir se o paciente apresenta algum diagnóstico psiquiátrico significativo, seu prognóstico e avaliar a necessidade de eventual terapia psiquiátrica. Embora a doença hepática onde a necessidade de avaliação psiquiátrica mais óbvia seja a cirrose alcoólica, várias outras situações também merecem atenção. Existem relatos de transplantes hepáticos bem sucedidos em pacientes esquizofrênicos e oligofrênicos, que tiveram seu diagnóstico firmado na avaliação psiquiátrica pré-operatória e foram tratados convenientemente tanto no pré quanto no pós-operatório.
Cada serviço de transplante hepático define suas normas para admissão de pacientes portadores de cirrose alcoólica. Atualmente, o critério mais aceito é que o paciente não deve apresentar alcoolismo ativo, com avaliação psiquiátrica favorável em relação a não recidiva do abuso de álcool. Mesmo assim, relata-se recidiva de alcoolismo após o transplante em cerca de 20% após dois anos.
Os critérios mais aceitos atualmente como contra-indicação absoluta de transplante hepático são: ideação suicida com ou sem recusa do transplante, psicose que limite o consentimento pós-informação ou a aceitação, e consumo ativo de substâncias psicotrópicas (incluindo álcool). São consideradas contra-indicações relativas: demência que seja ou de intensidade suficiente para afetar a capacidade de aceitação pelo paciente se os recursos psicosociais adequados não possam ser implementados, ou de um tipo que se saiba relacionar com alto risco de evolução adversa no pós-transplante (por exemplo, demência alcoólica); retardo mental com efeito incapacitante semelhante ao acima descrito para demência; doenças psiquiátricas refratárias a tratamento como depressão grave intratável; e não-aceitação ao sistema do transplante, interpretado como não aderência ao tratamento com alto risco de perda do enxerto.
Avaliação psicológica
Seu médico após conhecimento de seu histórico,de suas relações familiares,etc poderá encaminha-lo para o suporte psicológico, importantíssimo numa cirurgia tão complexa.
Avaliação odontológica
Descartar focos infecciosos dentários e caries é importante para o sucesso no pós transplante.