HEPATITE C É FREQUENTE EM HIV - POSITIVOS
Hepatite C: freqüente em HIV-positivos. Daqui a alguns anos a hepatite C deverá ser mais comentada do que a Aids. Essa afirmação que vem tomando vulto no meio médico – é baseada em dados alarmantes: estudo recente realizado pelo Instituto de Infectologia Emílio Ribas estima que existem aproximadamente 140 mil infectados pelo vírus da hepatite só em São Paulo, capital, e 2,2 milhões em todo o país. De 30% a 40% dos pacientes com HIV têm a hepatite C como co-infecção. O vírus da hepatite C – identificado há apenas uma década e testado no sangue desde 1992 – já atinge hoje 300 milhões de pessoas no mundo todo, cinco vezes o número de portadores de HIV. Silenciosa, a doença chega a demorar mais de 20 anos para manifestar-se, o que acontece normalmente quando o indivíduo enfrenta os primeiros sinais de deterioração das funções do fígado. Entre os soropositivos, esta realidade é mais séria: segundo pesquisa realizada pelo Instituto de Saúde Carlos 3º, de Madri, na Espanha, a hepatite C representa 85 % das internações por falência hepática entre pacientes com HIV. Apesar da ameaça de epidemia de hepatite C em grande escala pairar sobre a população mundial – a prevalência oscila entre 0,8% e 2% - os portadores do vírus HIV são as vítimas mais vulneráveis, por terem o sistema imunológico debilitado. No tratamento destes pacientes existe outro agravante: embora não tenha cura, a hepatite C é controlada com as drogas interferon e ribavirina. Elas, por si só, diminuem as defesas imunológicas já prejudicadas pela Aids. Início O termo “hepatite” significa inflamação no fígado. Muitas causas existem para uma hepatite, entre elas infecções, intoxicações (principalmente pelo álcool), medicamentes, distúrbios do metabolismo e sistema imunológico debilitado, além de outras causas desconhecidas. De todas, a mais conhecida é a hepatite viral. Ela é causada por diversos vírus, que atingem preferencialmente o fígado, mas podem atingir também outros órgãos. Existem muitos vírus que podem ser responsáveis pelas hepatites agudas e crônicas, já sendo conhecidos: A, B, C, D, E. Só em 1989 o vírus C foi identificado e a partir daí foram desenvolvidos os testes laboratoriais que permitiram o seu rastreamento. Dois anos após, estes testes passaram a ser feitos obrigatoriamente nos bancos de sangue, possibilitando a exclusão dos doadores que tivessem o vírus C, assim como já era feito com os portadores do vírus B. A hepatite aguda pelo vírus C é geralmente assintomática, com apenas 20 a 30% dos pacientes desenvolvendo sintomas leves. No entanto, o alto índice de cronificação (>85%) leva ao aparecimento de seqüelas, como a cirrose e o tumor primário de fígado. Esta evolução é provavelmente influenciada por fatores como a via de infecção, idade do hospedeiro, imunocompetência e perfil genético do portador. Felizmente, a forma fulminante é raramente descrita em pacientes com infecção pelo vírus C. Na maior parte dos casos, o diagnóstico é feito durante a realização de exames de rotina ou quando as pessoas comparecem para doação de sangue. O vírus C constitui atualmente o principal agente etiológico de doença hepática avançada. Felizmente, a progressão da hepatite crônica pelo vírus C é lenta, sendo necessários, em média, 20 a 30 anos para o aparecimento da cirrose, complicação que ocorre apenas na minoria dos casos (25%). De acordo com a região geográfica estuda, entre 30% e 75% dos casos de cirrose estão relacionados ao vírus C. Em todo o mundo, a cirrose pelo vírus C constitui a causa mais freqüente de transplante hepático em adultos (30-50%). Nos EUA, esse tipo de hepatite já provoca 10 mil mortes por ano. Em São Paulo, estudo divulgado no ano passado e realizado pelo Hospital Emílio Ribas em parceria com o Datafolha, detectou uma prevalência de 1,4%. Seriam certa de 140 mil infectados só na capital e 2,2 milhões em todo o país. Cerca de 50% da hepatite C do Brasil são provocadas por um subtipo de vírus conhecido com o1B que costuma causar um processo de cirrose hepática num período de 2 a 20 anos, capaz de levar à falência do fígado ou mesmo a um câncer. Os pacientes com esse subtipo adoecem mais rapidamente e respondem mal ao tratamentos. Em 99% dos casos, o vírus só será detectado quando surgir a doença. Causas A exposição a sangue infectado é o principal meio de aquisição do vírus C. Assim, as fontes maiores de contaminação são: uso de drogas injetáveis, hemodiálise, transfusão sanguínea, transplante de órgãos, tatuagem, acupuntura, ou escarificação com objetos contaminados com vírus, como ocorre por exemplo com a inalação de cocaína. A transfusão sangüínea já foi a principal fonte de infecção há mais de 10 anos, Por outro lado, o uso de drogas injetáveis tem aumentado progressivamente ao longo dos anos em todo o planeta. A contaminação não-parenteral, como a a sexual por exemplo, apesar de menos comum (tem torno de 5%), ocorre possivelmente em indivíduos com comportamento sexual de alto risco. Mas há formas de transmissão ainda desconhecidas do vírus. Entre 8% e 10% dos casos de hepatite C são indeterminados. Cogita-se até formas inusitadas de transmissão, como através de água, comida e até mordida de animais. Uma vez que a infecção pelo vírus C foi identificada, um especialista no assunto deve ser consultado: um gastroenterologista ou em hepatologista (especialista em doenças do fígado). Inicialmente serão realizas as chamadas provas da função hepática, exames realizados no sangue que irão refletir as diversas funções do órgão: síntese de proteínas e fatores da coagulação, necrose celular, fluxo biliar etc. Também serão pesquisados marcadores para outras doenças hepáticas que podem existir paralelamente ou estar confundindo o diagnóstico real. A confirmação definitiva da infecção pelo vírus C será dada pela pesquisa do RNA viral, empregando técnicas modernas e sofisticas de biologia molecular, que só os laboratórios bem equipados são capazes de realizar. Além da avaliação laboratorial serão realizados outros exames, como ultrassonografia e endoscopia, que irão fornecer novos dados sobre a extensão do problema. Um dos exames indispensáveis deverá ser a biópsia hepática, exame em que um fragmento do fígado será examinado pelo patologista para caracterizar a lesão hepática existente. Após ter todos esses dados nas mãos, será possível o médico fazer o diagnóstico completo da doença, do seu estágio de evolução das perspectivas de terapêutica e do seu prognóstico. Drogas anti-HIV e fígado Estudo publicado recentemente no Journal of the American Medical Association (JAMA) avaliou a toxicidade das drogas anti-retrovirais no fígado em pacientes que apresentam co-infecção pelo HIV e pelo vírus da hepatite. De acordo com o artigo, 12% dos portadores de ambos os vírus tiveram danos hepáticos graves. Isto porque, como a hepatite C já causa danos progressivos ao fígado, com uso de anti-retrovirais o problema aumenta. Conclusão relevante para os pacientes com HIV, visto que estima-se que no Brasil cerca de 30% a 40% deles apresentem a co-infecção. Outro resultado importante deste estudo sugere que os danos no fígado causados por inibidores de protease podem ser tão graves que o coquetel anti-HIV precise ser suspendido. Foram acompanhados 211 pacientes da Universidade de Johns Hopkins, nos Estados Unidos, onde 10% dos portadores do HIV apresentavam esse quadro, em que as drogas anti-retrovirais causaram danos hepáticos tão graves que o tratamento precisou ser interrompido. Os inibidores de protease – muitas vezes essenciais para o controle do HIV – apresentam um risco cinco vezes maior ao fígado do que os demais componentes do coquetel anti-HIV. A droga ritonavir foi a que apresentou a maior toxicidade. Doenças hepáticas foram apontadas como a principal causa de morte em pacientes com HIV durante o Encontro da Sociedade de Doenças Infecciosas dos Estados Unidos, em novembro de 99. Como o vírus que provoca a Aids também causa danos ao fígado, são três fontes diferentes provocando danos hepáticos: o HIV, o vírus da hepatite C e os anti-retrovirais. Por isso é necessário um acompanhamento rígido do funcionamento do fígado durante o tratamento com drogas anti-retrovirais, principalmente quando houver o inibidor de protease. Ou seja, quando o problema hepático está sendo acompanhado, é possível mudar o esquema terapêutico para evitar danos graves, que requerem a interrupção do tratamento. “Temos um dilema em como tratar o paciente com a co-infecção pelo vírus da Aids e da Hepatite C”.As drogas usadas para tratar a hepatite C, o interferon e a ribavirina, diminuem a contagem das células de defesa. Com isso, o paciente com o HIV, que já apresenta problemas no sistema de defesa do corpo, fica mais suscetível a infecções oportunistas.