Mau hálito ou halitose
O curioso em relação ao mau hálito é que os portadores não conseguem perceber o odor desagradável que exalam. São os outros que notam e ficam constrangidos em avisar – “olha, teu hálito não está legal”. Às vezes, nem toda a intimidade do mundo justifica uma atitude como essa e o problema não é enfrentado como deveria.
O cheiro está tão ligado às emoções e hálito desagradável pode provocar repulsa e afastamento, muitas vezes, irreversível. Casais podem relevar desencontros, vencer diferenças de personalidade e das formas de enxergar a vida, podem até esquecer os maus passos dados por um deles, mas é muito difícil que consigam superar a inconveniência do mau hálito de um dos parceiros.
Na grande maioria dos casos, o mau hálito, ou halitose, tem origem na própria língua, (imagem 1) um órgão muscular revestido por papilas. Essas papilas possuem terminações nervosas que, estimuladas por determinadas moléculas, conduzem informação ao cérebro a fim de reconhecer o gosto das coisas. Como se pode observar na imagem 2, na parte posterior da língua, sobram espaços entre as papilas e se formam pequenas criptas. Neles se acumulam alimentos e restos de células que descamam do epitélio lingual. Esses resíduos funcionam como meio de cultura para as bactérias que, quando fermentam, liberam substâncias ricas em enxofre, e é o cheiro de enxofre que provoca o mau hálito.
Meios de diagnóstico
– Quando recebe uma pessoa que diz –“minha mulher disse que estou com mau hálito” – que tipo de pesquisa você faz?
– Existe um protocolo de atendimento clínico a ser seguido. A anamnese precisa ser muito bem feita para eliminar possibilidades de causas fisiológicas. Deficiências renais ou hepáticas e diabetes mellitus, por exemplo, podem causar halitose. Uma pessoa com diabetes pode eliminar odor cetônico por via pulmonar. Nesse caso, o paciente deve ser encaminhado para exames específicos e atendimento de especialistas na matéria.
A investigação inicial inclui, também, o exame detalhado da boca, da língua e da parte dentária porque resíduos, placas bacterianas e bactérias podem ficar acumulados em várias regiões da boca. Gengivite e periodontite são causa de halitose e merecem tratamento. Cáries mais extensas, além de reter restos de alimentos com bactérias, podem atingir a polpa do dente e a mortificação pulpar emana odor desagradável.
Portanto, a avaliação clínica não é só lingual, mas de todos os tecidos moles e da parte dentária. Por fim, faz-se uma medição para avaliar a quantidade de odor de enxofre contida no hálito utilizando um aparelho projetado para esse fim específico.
– O que é mortificação pulpar?
– Os dentes são revestidos de esmalte e compostos por um tecido mineralizado, a dentina. Nela existe um canal central – a polpa - que constitui a parte viva do dente e é basicamente composta por vasos e nervos. Quando a cárie é muito extensa, pode atingir a polpa e provocar mortificação pulpar, isto é, a putrefação de tecidos responsável pela liberação de odor muito desagradável.
Aparelhos para medir a halitose
– Como é feita a medição do hálito?
– Existem alguns aparelhos próprios para essa medição como o halímetro e o breathalert, um halímetro portátil lançado no mercado recentemente e que permite ao paciente controlar o próprio nível de halitose. Numa escala que vai de zero a quatro, o aparelho mede o grau do distúrbio. O número quatro indica uma halitose mais forte; três, halitose menos forte; dois, uma mais branda e o um registra a ausência do problema.
– Como principio básico, esses aparelhos detectam a concentração de enxofre que existe no hálito. Eles custam caro?
– Custam por volta de U$100,00. Os portadores de halitose não costumam considerá-los um equipamento caro, porque os problemas sociais com que se deparam por causa desse sintoma são muito sérios.
Estratégias para descobrir a incidência de halitose
– Como as pessoas podem descobrir que estão com mau hálito se elas mesmas não notam e os outros não falam?
– A forma mais simples é perguntar para uma criança que, geralmente, é mais sincera é espontânea. O provável é que ela fale a verdade se o problema existir. Pode-se também usar meios mais sofisticados como o medidor de halitose. Existe, ainda uma espécie de disque-denúncia. Sem se identificar, você liga e indica um portador de halitose para tratamento.
– Nunca imaginei que isso pudesse existir. É um disque-denúncia de halitose?
– Basicamente é isso. Se existe uma pessoa próxima portadora de halitose e você não tem coragem de falar-lhe – “Olhe, você está com um odor desagradável na boca; vá procurar atendimento.” -
– Como se dá essa abordagem?
– Existe um método especial para entrar no assunto e o tipo de abordagem depende da reação da pessoa contatada.
– Isso funciona? As pessoas se interessam e vão procurar auxílio?
– Elas acabam se interessando, especialmente quando são portadoras de halitose crônica porque descobrem que existe uma série de envolvimentos sociais e afetivos relacionados ao problema.
Na Associação Brasileira de Estudos de Odores da Boca, também há um disque-denúncia à disposição. Normalmente, quando a pessoa fica sabendo que tem mau hálito, procura tratamento.
Prevenção e tratamento da halitose
– Como se pode evitar o mau hálito e com ele pode ser tratado?
– O mais importante é levantar o diagnóstico correto, procurar descobrir se a halitose é sistêmica ou local (na boca) antes de estabelecer qualquer plano de tratamento. Sendo sistêmica, encaminha-se o paciente para um profissional especialista na área. Se é bucal, devem ser localizadas todas as possíveis causas da halitose: gengivites, periodontites, placas bacterianas, cáries dentárias e a língua.
A escova não é eficiente para a remoção dos restos epiteliais e de bactérias no dorso da língua, mas existem raspadores linguais capazes de remover os resíduos. (imagem 3)
– Como funcionam esses raspadores de língua?
– No consultório, o raspador de língua é de aço inoxidável, o que permite a esterilização, mas há outros tipos à venda nas farmácias. Com ele se remove a saburra da língua sempre de trás para frente. (imagem 4) Segurar a ponta da língua com uma gaze para puxá-la um pouco para fora ajuda a operação e outra gaze pode ser usada para recolher os resíduos. No começo, a pessoa sente um pouco de náusea, mas ela diminui com o tempo e o autocontrole desenvolvido.
– Quantas vezes por dia isso deve ser feito?
– Aos portadores de halitose, recomenda-se que passem o raspador três vezes por dia ou até mais se tiverem disponibilidade. No entanto, esse tratamento não é indicado só para pacientes com halitose crônica. É indicado para a população em geral, ao menos uma vez por dia, antes de dormir ou no horário em que for possível fazer uma higienização melhor da boca.
É importante ressaltar, porém, que além da higiene oral, da consulta ao dentista, da remoção da placa bacteriana, é necessário escovar os dentes, no mínimo, três vezes ao dia e, diariamente, passar fio dental e remover a saburra lingual com raspador de língua.
– Vocês conseguem controlar a halitose só com esse tipo de medida?
– Conseguimos. Foram observados resultados excelentes em pacientes que já haviam feito inúmeras endoscopias e corrido atrás de vários tratamentos. Com a raspagem lingual, o problema da halitose desapareceu.
– Interessante perceber que um problema dessa seriedade, com tanta interferência social, pode ser resolvido bebendo de dois a três litros de água por dia para manter a saliva fluida e raspando a língua com esses instrumentos tão simples.
– Existem outros cuidados que devem ser observados. Alimentação mais fibrosa ajuda na limpeza do dorso da língua e aumenta o fluxo salivar.
Na verdade, se o problema for apenas lingual e bucal, pode ser resolvido com medidas bastante simples como a higienização adequada. O que falta, no momento, é um pouco de orientação para as pessoas que não conhecem a causa mais freqüente da halitose e os meios para combatê-la.
–Essa mania de chupar balas ou tomar refrigerantes entre as refeições traz algum benefício?
– Na verdade, trata-se de um paliativo porque não se está tratando a causa. Estamos camuflando as conseqüências. Uma bala na boca não é remédio para a halitose, apenas disfarça o cheiro provisoriamente.
Alguns odores vêm do pulmão e chupar balas não vai removê-los. Odores de fumantes não são bucais. São exalados pelas vias aéreas e a bala só alivia o odor do hálito.
– E chiclete, ajuda em alguma coisa?
– Como o chiclete aumenta a salivação, pode melhorar um pouco a halitose, mas é preciso tomar cuidado e mascar apenas chicletes sem açúcar. Chicletes com açúcar alimentam a placa bacteriana na boca e provocam maior fermentação. No entanto, é bom lembrar que mesmo os sem açúcar não atacam a causa principal da halitose que é o acúmulo de muco ou de saburra no dorso da língua. Eles apenas melhoram provisoriamente o mau hálito.
– Vamos, então, repetir as medidas mais importantes para evitar a halitose.
– No que se refere à higienização caseira, as três medidas mais importantes são: escovação pelo menos três vezes por dia, fio dental e raspador de língua diariamente. No entanto, é preciso consultar o dentista com freqüência para uma higienização mais profissional. Às vezes, a pessoa não consegue remover a placa bacteriana ou o acúmulo de tártaro principalmente na região inferior dos dentes.